segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

overdose.




I
nsetos, átomos, bolinhas transparentes, insetos... Girando, girando... Cada vez mais depressa ao redor da lâmpada fluorescente. E a musica toca sem parar a quase três horas. Um vulto passa pela janela aberta. Não é ninguém, não é ninguém... Isso não importa. Apenas o chão importa. Meu único e fiel companheiro, que me apara toda noite. E me vem um pensamento embaralhado, um pensamento atrapalhado, eu ligaria pra dizer. Dizer o que? “Oi, to sozinha em casa, não quer vir até aqui, beber um pouco e fazer sexo?”. Que se dane. O que importa é o chão, somos só nos dois agora, todas as noites. Dançando a mesma musica, o mesmo ritmo, o mesmo passo... Um pra frente, dois pra trás... Um pra frente, dois pra trás... E eu vivo sendo nos dois, ele e eu, juntos, para sempre. Não se preocupe. É a minha ultima tragada, prometo. É a ultima a mais de um mês. Não importa. Agüento mais uma, mais duas, mais três... Qual é? Só tem nos dois aqui, vai me passar sermão agora? Não vê que estou passando mal? Quero vomitar... Quero vomitar até sair às tripas, até sair à dor, até sair o coração. Quero vomitar, mas não consigo, quero pensar, mas não consigo, quero levantar, mas não consigo. Eu disse, o que importa é o chão. O chão e eu. E os átomos não param de circular, os inspiro, os expiro, os regurgito, de segundo em segundo. As bolinhas transparentes aumentam, elas estão por todo lado. Alguém aí vê bolhinhas transparentes? Eu vejo o tempo inteiro, mas já me acostumei a ignorá-las. Talvez eu esteja louca. Mas não importa. Apenas o chão importa. Somos só nos dois agora. E ele passa as mãos frias pelo meu rosto, segura as minhas mãos que soam frio. Ele me diz pra agüentar firme que vai ficar tudo bem. Ele me ama, eu sei. Ele sussurra algo que não consigo entender e depois passa a língua gelada por dentro do meu ouvido. Eu sorrio. Eu choro. Ele fica em silêncio. Ele sabe que estou passando mal. Estou intoxicada de sentimentos pequenos que fui aumentando e aumentando ao longo de todos esses anos. Estou intoxicada de remédios para dor, isso tudo se mistura, se mistura com as drogas e os remédios que fui tomando e tomando sem querer parar. Dói meu coração. E desesperada tento achar os braços do chão, que é pra ele me abraçar forte. Mas não os acho, não os acho. As bolinhas transparentes vão sumindo de uma a uma, espocando como bolhas de sabão. Os átomos vão parando de sair de mim e vão se espalhando pela minha alma. Os insetos ainda giram, só que agora lentamente, quase parando, olhando para mim curiosos. Mas isso não importa. Eu já disse. O que importa é o chão, o que importa é só nos dois. O chão e eu. Eu e o chão. O chão. Somente o chão.
[Nini C]

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